quinta-feira, 30 de abril de 2009

Mistéryos

Por Alexandre Cunha

Segundo longa-metragem exibido no festival, a produção curitibana Mistéryos (Beto Carminatti e Pedro Merege, 2008) deixa-nos, ao menos, uma reflexão: como um festival do porte do CINE-PE, que se dá ao luxo de receber o vencedor do oscar Costa-Gavras, tem a coragem de exibir uma obra desse nível na mostra mais importante do evento? Tão escandaloso quanto é constatar que, na mesma noite, subiram ao palco, homenageados, o lendário Fernando Spencer e a talentosa Dira Paes, atriz com mais filmes na bagagem após a retomada do cinema nacional, pós-Collor. O sentimento de frustração, durante os rastejantes 80 minutos do filme, foi, arrisco dizer, pleno.

Tentativa absurdamente equivocada de criar uma atmosfera sombria, a produção aborda três casos supostamente misteriosos. Pretensão pura. Em momento algum há, de fato, suspense na tela e a insistência nas (três) histórias risíveis torna a película numa incessante tortura cinematográfica (em todos os aspectos, todos). O roteiro, beirando o amadorismo, se utiliza de fórmulas clichês (e altamente mal usadas) para dar fluência à narrativa. O uso de legendas, transmissões radiofônicas e depoimentos dos personagens demonstram preguiça e pragmatismo por parte dos idealizadores. A narração em off desgasta e diálogos como "- tô esperando meu namorado./ - enquanto ele não chega, eu te faço companhia." extermina a paciência presente em cada alma cinéfila. Se há algum ponto não tão negativo no filme, é a fotografia. Quase sempre escura, é adequada à proposta do enredo.

Os atores fazem o que pode com a estupidez que lhes fora incumbida. Mas, só de participar de algo do tipo, é condenável. Carlos Vereza, grande ator, parece não mais se importar com as produções que adentra. Depois do protótipo de novela "Bezerra de Menezes: O diário de um espírita", o veterano intérprete mancha ainda mais sua carreira com "Mistéryos". Merece certo mérito, porém, por, ainda que dentro do absurdo, conseguir extrair uma atuação eficiente. Seria mais interessante, entretanto, utilizar a competência que possui em algo relevante. Atores das simulações do extinto Linha Direta seriam, certamente, adequados a esta produção, que me fez sentir saudades de Você Decide.

Ao acender das luzes, os remanescentes espectadores (leia-se batalhadores) agradeciam. Não aos realizadores, não à organização, mas à inflexibilidade do tempo que, ainda bem, não se atrasa. Nos créditos, orei. Implorei aos deuses cinematográficos para que os próximos longas do festival não sejam tão 'longos'. Que minha fé não seja abalada.

2 comentários:

Paulo disse...

Gosto não se discute. Apesar de sua crítica ter sido aparentemente fundamentada (o filme não é uma obra-prima, está bem claro), há limites para tudo. E o filme (e sou cinéfilo) não foi tão agoniante e escrachante quanto você narra. Considerando o nível de filmes apresentados em outras edições do festival (como Ouro Negro no ano anterior) Mistéryos foi 'filé'.

Cineclube Revezes disse...

Concordo contigo, Paulo. Ouro Negro foi uma das piores coisas que já vi no festival. Mas, então, a curadoria vai se basear nos projetos mais fracos para, daí, escolher os longas "melhorzinhos"? Tudo bem que é importante dar espaço a todos (Ouro Negro entrou no circuito nacional? Acho que não, me corrija se eu estiver errado), mas o festival já demonstrou inúmeras vezes que tem capacidade de exibir coisa boa (Ex: Árido Movie, Cão Sem Dono, etc).

Sobre o filme, eu achei realmente fraquíssimo. As legendas ("polícia", "21 de abril de 1969") são absurdas, cara. Muito desnecessário. E "Sapho - O amor entre as mulheres"? Tinha algum mistério nessa bendita história? O dano nos rolos do filme? Pra mim, isso é desculpa de quem não é capaz nem de produzir um "filminho" dentro do filme em si. Lamentável, lamentável.

Mas gosto é gosto, como você bem frisou. Valeu por entrar no blog e comentar. Discussões são sempre bem vindas. Abraço.

Alexandre Cunha